Capítulo 5 Tão ruins quanto se pode ser
A fúria subiu das profundezas do coração de Samuel.
“Casimir, tem algo estranho em você hoje. Na frente da Waverly, passou o tempo todo defendendo a Raylee. Se alguém está fora de lugar aqui, esse alguém é você, o noivo dela!”
Em seguida, ele lançou um olhar de desprezo para Raylee.
“Você é bem esperta, hein? No seu primeiro dia fora da prisão, já conseguiu chamar a atenção do seu ex. Notei que você anda com dificuldade. Está se fazendo de coitadinha para despertar pena? Ainda conseguiu que ele te arranjasse um quarto? Só vocês dois, juntos num quarto... será que aconteceu alguma coisa que não deveria?”
Irritada, ela disparou: “Sr. Goodridge, sua mente é suja, então não projete essa imundície nos outros! Não foram vocês mesmos que pediram pra eu me arrumar antes de ver a vovó? E alguém me deu dinheiro para isso? Se não fosse o Casimir me emprestar, como eu ia pagar um quarto? Sim, tenho dificuldades para andar. Isso não estava no laudo médico? Hoje mesmo, logo que saí da prisão, você me arrastou violentamente para fora do carro e me machucou. Já se esqueceu do mal que me causou, Sr. Goodridge? É claro, agora você já encontrou sua irmã biológica, então por que se importaria com uma estranha como eu?”
Raylee finalmente colocou pra fora a mágoa acumulada.
Ela já tinha cumprido sua pena. Não tinha por que continuar sendo humilhada.
“Raylee, peço desculpas em nome do Samuel.” Waverly falou com a voz embargada, fazendo uma reverência profunda. “Por favor, não fique brava. Ele não teve a intenção. A culpa é minha. Não devia ter voltado pra essa casa.”
A expressão dócil e obediente dela derreteu o coração de Samuel.
Ele imediatamente afagou suas costas, tentando consolá-la com carinho.
“Waverly, isso não é culpa sua. É ela que está tentando causar confusão. Não leve a sério o que ela diz. Esqueci de te avisar, a Raylee é uma atriz de mão cheia. Ela sabe como exagerar tudo e botar lenha na fogueira. Sobre essas histórias do passado, melhor não acreditar totalmente. Vivi dezoito anos com ela, conheço bem quem ela é!”
Harriet parou de chorar e foi até Waverly para consolá-la. “Ouça seu irmão. Isso não tem nada a ver com você, não precisa se sentir culpada.”
A mensagem era clara. Ela aceitou a versão de Samuel como a verdadeira e tratou as palavras dela como distorcidas.
Raylee observou aquela cena de união familiar e, de repente, começou a rir, incrédula.
Sou uma atriz? Exagero minhas palavras?
Eles são os “familiares” que ignoraram completamente os quatro anos que passei à beira da morte.
Não me deixam me defender e sempre assumem o pior de mim, com a maior crueldade possível.
Cada segundo que permanecia ali fazia parecer que eu estava traindo a liberdade que tinha acabado de conquistar.
“Desculpem, vou voltar pro hotel descansar. Quando a vovó acordar, venho visitá-la de novo”, Raylee disse com calma, fazendo uma reverência antes de sair do quarto.
Determinada, ela se levantou da cama e saiu, com passos cambaleantes por conta da deficiência nas pernas.
Seu corpo balançava a cada movimento, tornando cada passo uma verdadeira batalha.
Harriet não conseguiu segurar o choro e cobriu a boca, soluçando.
Quando ela estava prestes a ir atrás de Raylee, Samuel a impediu.
“Mãe, deixa que eu vou.”
Raylee tinha acabado de deitar na cama do hotel quando ouviu batidas na porta.
Uma voz familiar soou do lado de fora.
“Sra. Goodridge, sou eu, Casimir.”
Depois de hesitar por um instante, Raylee abriu a porta.
Casimir segurava duas sacolas grandes e parecia prestes a entrar no quarto.
Raylee o deteve, com o tom indiferente.
“Sr. Sutherland, isso talvez não seja muito apropriado.”
Se a família Goodridge descobrisse, certamente começariam a fazer insinuações. Pensariam que os dois estavam sozinhos ali com segundas intenções.
Ela podia ignorar fofocas, mas não podia dar margem para aqueles que a machucaram encontrarem novos motivos para continuar ferindo-a.
Casimir ficou surpreso por um instante.
Olhando para o rostinho dela, agora sem expressão alguma, sentiu uma irritação inexplicável.
Aquela menina falante que vivia dizendo o quanto o amava tinha desaparecido.
A Raylee de hoje parecia outra pessoa, como se tivesse trocado de alma. Tão diferente que ele mal a reconhecia.
“Tudo bem então, comprei uns remédios e comida pra você.”
Casimir estava prestes a entregar as coisas quando um vulto se aproximou com passos firmes.
Era Samuel.
Ele ficou surpreso ao ver Casimir.
“O que você tá fazendo aqui?”
“Só vim deixar umas coisas pra sua irmã, já estou de saída.”
“Já que ela é minha irmã, não tem por que você se preocupar.”
O olhar de desprezo de Samuel pousou em Casimir, insinuando que o interesse dele não era nada inocente.
Depois, ele se virou para Raylee e disparou: “Já não te avisei que ele agora é noivo da Waverly? Por que você age como se não tivesse noção de limites? Ou será que depois de quatro anos na prisão, você voltou cheia de rancor e resolveu se aproximar dele só pra irritar sua irmã? Sua vagabund*!”
Raylee ficou vermelha de raiva. Foi pega de surpresa pelo ataque.
Ela lançou um olhar mortal para Samuel, como se quisesse atravessá-lo com os olhos, e respondeu: “Sr. Goodridge, está com medo que os outros não percebam o canalha que você é?”
Samuel ficou furioso.
“Você me chamou de canalha?”
Casimir interveio, defendendo Raylee.
“Chega, Samuel! A Sra. Goodridge não se aproximou de mim de propósito. Pare de atacá-la com esse veneno todo!”
Raylee se virou contra Casimir também.
“Cala a boca, não preciso da sua defesa hipócrita! Vocês dois são farinha do mesmo saco. Não valem nada!”
Samuel ficou sem reação.
Raylee não só recusou se fazer de vítima para ganhar a simpatia de Casimir, como ainda o enfrentou sem medo.
“Fora daqui! Todos vocês, fora!”, ela gritou, furiosa, e bateu a porta na cara dos dois.
Ambos ficaram parados do lado de fora, atônitos.
Samuel bateu na porta várias vezes, mas Raylee não abriu, o que o deixou ainda mais irritado.
Casimir, já impaciente, disse: “Vamos embora. Se eu estivesse no lugar da sua irmã, também estaria irritado. E se você não tem nada de útil pra dizer, é melhor ficar quieto. Ninguém vai te chamar de mudo por isso.”
Samuel lançou um olhar furioso e debochou:
“Casimir, como é que você ‘esbarrou’ com a Raylee no hotel e ainda pagou o quarto dela? Esse ‘encontro por acaso’ está cheio de falhas! Quando estava voltando da prisão, vi um carro familiar. Era o seu, né? Você já estava planejando buscá-la, não estava?”
Ele não negou.
Tomado pela raiva, Samuel agarrou Casimir pela gola e gritou: “Você está querendo ficar com a sobra, é isso? Seu canalha! Como é que você pode fazer isso com a Waverly?”
“Raylee também é sua irmã, mas você é completamente parcial! Se você não se importa com ela, quer dizer que ninguém mais pode se importar também?”
“Pra quê se importar com ela? Ela nem te deu atenção! Recusou tudo o que você tentou oferecer. Quatro anos atrás, você foi cruel com ela. Acha mesmo que vai ser tão fácil assim conseguir o perdão? Não se iluda!”
“Ela nunca vai me perdoar, nem a você. Todos nós erramos com ela há quatro anos, mas o pior de todos foi você!”, respondeu Casimir, com raiva. “Ela passou quatro anos vivendo um inferno na prisão, e você não só virou as costas, como ainda declarou que a Raylee não fazia mais parte da família Goodridge! Grande parte da dor que ela sentiu foi culpa sua!”