Capítulo 8 O capo da máfia
Sozinha naquele cubículo frio, Lívia se deitou no banco reto onde se encolheu, por um instante pensou no pobre homem agredido por Enrico sem piedade, o pobre homem nem ao menos pôde ver a filha recém-nascida.
Ela enfiou as mãos no meio das pernas para tentar se aquecer do frio. As pálpebras já estavam quase se fechando quando ela ouviu o barulho da porta se abrindo.
A médica se levantou, enquanto os passos pesados ecoavam pelo corredor.
Lívia segurou as grades da cela tentando espionar, mesmo sem conseguir ver, imaginou que fosse Enrico, então começou a esbravejar sobre a demora para liberá-la e a julgá-lo por sua tamanha ingratidão com as pessoas que lhe ajudaram.
— Você nem mesmo o agradeceu! — Ela repreendeu — Vi o que fez com o pobre homem! Tratou os seus seguranças com tanta grosseria e violência. — disse, indignada. — Você nem mesmo deixou o homem ver a filha recém-nascida! — berrou.
O corpo de Lívia ficou paralisado e a voz falhou quando viu o homem robusto, apenas alguns centímetros mais baixo que Enrico, ao se aproximar da cela.
— Buongiorno!
O rosto enrubesceu ao fitar o homem que tirou o chapéu fedora preto. Lívia notou o anel de ouro que reluzia no dedo indicador capo. A calça de linho preta de Don Bianchi combinava com o blazer.
— Bom… bom dia! — gaguejou. — Me desculpe, pensei que fosse Enrico.
— O meu sobrinho está descansando um pouco. — Ele olhou-a de cima a baixo. — O médico da família cuidou dele. Meu sobrinho é duro na queda, Enrico sobreviverá.
A médica recuou no momento em que o tio de Enrico chegou mais perto das grades. Lívia tinha um belo rosto anguloso e seu corpo tinha curvas que chamavam a atenção.
— O meu sobrinho não é bobo! — Massimo esboçou um sorriso malicioso, revelando um dos dentes de ouro. — Una bella ragazza!
Com medo, ela decidiu não enfrentar o homem que parecia mais cruel do que Enrico.
— Seu rosto não me é estranho! — Ele coçou o queixo, estava pensativo. — Não tem como esquecer um rosto tão lindo como o seu.
— Eu acho que o senhor está me confundindo com outra pessoa! — murmurou.
— Você é casada com um dos nossos colaboradores? — Os grandes olhos inquisidores avaliaram Lívia do alto da cabeça até o par de calçados que escondiam seus pés.
— Não!
— Você parece familiar. — Os olhos perspicazes de Don Bianchi se mantinham presos a médica.
— Eu trabalho num Hospital no Centro de Florença.
O tio de Enrico ainda estava surpreso com os traços delicados de Lívia.
— Eu não sei! — Lívia respondeu rapidamente. — Não me lembro de muita coisa.
— E quanto ao seu pai? Poderia me dizer o nome do artista que fez essa bela obra de arte! — Indicou o corpo de Lívia com um aceno.
— Sou órfã! — respondeu com veemência.
Lívia não tinha o que falar sobre os pais que a abandonou no orfanato. Assim como as outras crianças, ela foi deixada no cilindro mais conhecido como a Roda dos Excluídos.
Don Bianchi continuou questionando a refém, que se mantinha sucinta em suas respostas. Lívia estava atenta e só lhe deu informações insignificantes.
— Onde você nasceu?
— Na Itália.
— Em que orfanato você ficou?
— Santa Maria. — Lívia mentiu.
O rosto impassível de Don Bianchi se concentrou nas pupilas tão escuras quanto uma pedra de ônix. Não havia nenhum resquício de emoção no rosto do Capo da máfia.
Don Bianchi se virou. Seguiu em passos rápidos até a saída. Ainda pensava naquela bela garota com um olhar sombrio.
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No escritório, os dedos tamborilavam no tampo de madeira da mesa. Don Bianchi refletia sobre a garota enjaulada. Ele lembrou do rosto sombrio de Lívia no momento em que perguntou sobre a sua família.
— Mandou me chamar, Don Bianchi? — O consigliere cruzou a porta.
— Quero que descubra tudo sobre a médica que Enrico trouxe para a minha casa!
— Ah, sim! A doutora Lívia.
— Você a conhece? — Massimo olhou para o conselheiro com desconfiança.
— Não!
— Como sabe o nome dela?
— Me entregaram a bolsa com a documentação e os aparelhos eletrônicos da doutora.
O conselheiro abriu o zíper e virou a bolsa, despejando todo o conteúdo sobre a mesa. Massimo puxou o documento de identificação e observou o CRM da doutora Ricci.
— Investigue o passado dela e me traga respostas o mais rápido possível.
— Sim, Don Bianchi!
Pensativo, o tio de Enrico continuou observando a foto de Lívia no documento.
— Como está o meu sobrinho? — indagou antes que o conselheiro se retirasse.
— Ele despertou, está comendo.
— Isso é tudo! — Dispensou o funcionário.
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A toalha de linho branco envolvia a cintura de Enrico enquanto ele caminhava pelo enorme quarto decorado de maneira clássica, abriu o guarda-roupa e retirou a camisa branca de manga longa e a calça preta. Após se vestir, modelou os cabelos com o gel e dobrou a manga da camisa até a altura do antebraço.
— Vejo que já se recuperou.
— Sim, tio Massimo!
— Deveria descansar um pouco mais.
— Vou conversar com aqueles incompetentes. Eu quase morri!
— Não foi o que eu soube! — Massimo riu. — Fiquei sabendo que você matou dez.
Enrico fechou os botões da blusa e ergueu o rosto para o tio que sentou na poltrona.
— Eu não tive outra opção a não ser lutar.
— Você foi treinado para vencer. Lembre-se de que deve se vingar do assassino de seus pais.
— Não há um só dia em que eu não pense nisso.
Massimo se levantou e caminhou até a porta aberta.
— Tenho que sair para uma reunião, cuide de tudo enquanto eu estiver fora.
Enrico apenas observou o tio deixar o quarto. Colocou o relógio de ouro em torno do pulso esquerdo e seguiu em direção ao local onde ainda mantinham Lívia presa.