Capítulo 7 Frente a frente com o inimigo (III)
- Minha irmã Olívia tem uma foto do seu irmão – a aprendiz de adolescente mencionou, direcionando-se a mim – Está no quarto dela.
- Sua irmã é uma sonhadora? – Sorri, com todo meu sarcasmo.
- Na verdade é apenas uma garota de bom gosto! – ela piscou e bebeu um gole da água que havia na taça.
Notei que elas ainda não haviam feito os pedidos.
- Desejo batatas Chipperbec com champagne Don Perignon e vinagre francês Ardenne, fritas em gordura de ganso e temperadas com sal trufado francês e raspas de trufas italianas e queijo pecorino. Substitua o molho da casa pelo molho Mornay, com queijo suíço. De sobremesa uma cassata italiana saborizada com licor Bailey’s com compota de manga e romã. A base precisa ser de Zabaione. Quanto à bebida... Traga o tive de melhor na casa, por favor. Afinal, estamos comemorando, não é mesmo senhor Abertton?
Logo as mulheres da família começaram a fazer seus pedidos. Esperei que todas escolhessem e chamei o maitre novamente, solicitando mais um prato do menu.
- Você come bastante – a aprendiz de adolescente chamou minha atenção – Nem sei como consegue ser magro.
- Eu não comi ainda! – Olhei diretamente para ela, que seguiu com a cabeça erguida, fixando o olhar no meu. Petulante!
- Minha irmã não pode comer muito. Ela tem diabetes tipo 1. Seu irmão Jorel come tanto quanto você?
Ela estava mesmo me perguntando quanto Jorel comia? Eu não via Jorel comer há no mínimo uns cinco anos. Vivíamos vidas separadas. Só nos falávamos uma vez por mês, quando ele vinha na sede da Clifford pegar o dinheiro. Eu nem sabia se meu irmão era alérgico a alguma coisa. E não tinha obrigação nenhuma de saber.
- Jorel prefere comer outras coisas e não comida. – Não me contive, percebendo o olhar repreensivo da senhora Abertton.
- E então, senhor Abertton? Temos um acordo? – Perguntei.
- Não, senhor Clifford. Infelizmente não temos um acordo. – o homem pagou para ver.
- Como assim você não aceitou um acordo? – A senhora Abertton deixou clara sua insatisfação com o marido.
Esperei que viessem os pratos enquanto ouvia a aprendiz de adolescente falando sem parar. A parte boa é que a aprendiz de modelo não conseguia se inserir na conversa, porque a caçula não deixava. Me dei em conta que não precisava muito para Olívia ser a preferida do pai, já que as duas filhas dele que estavam ali eram simplesmente chatas e inconvenientes.
O dono da concessionária rodoviária Abertton, em processo de falência, já que comprei todas as empresas que competiam com ele e investi pesado a fim de deixá-lo sem ter como lutar contra todas, que na verdade eram só uma, estava tão pálido quanto o guardanapo.
Ele tinha contraído vários empréstimos para concluir trabalhos que havia começado, tentando tirar o nome do negativo para poder concorrer a licitações e no fim já nem tinha mais como pagar os funcionários, que batiam na sua empresa fazendo ameaças. E sim, comprei todos os bancos nos quais ele contraiu dívidas. E a cada um deles usei de contratos cada vez mais impossíveis de serem cumpridos financeiramente. No fim, Ernest devia mais do que era capaz de pagar naquela vida. Na verdade, eu nem sabia como aquele homem ainda mantinha a família comendo e bebendo.
Assim que a comida foi servida, dei uma garfada e olhei para Ernest Abertton:
- Sua resposta final é não?
- Minha resposta final é não. – Confirmou, hesitante.
Levantei-me, afrouxando um pouco a gravata, certo de que estar perto daquele homem monstruoso era o que me deixava quase sem ar.
- Sofra as consequências de sua decisão, senhor Abertton.
Saí sem despedir-me. Antes de deixar o local, avisei ao maitre:
- A conta será paga pelo senhor Abertton. Sinceramente não costumo fazer isto, mas ele insistiu.
Não que eu precisasse dar satisfação a um simples maitre, mas queria deixar claro que Ernest arcaria com o valor. Para mim o valor final de tudo que fora consumido naquela noite era o que eu costumava dar de gorjeta para bons garçons em restaurantes em Dubai, por exemplo. Mas sabia que Abertton suaria frio ao saber que bancaria o consumo. O prejuízo sairia por conta dele e não meu. Eu sabia que Ernest voltaria atrás em sua decisão e uniria o chuchu ao meu irmãozinho playboy e que agora eu havia descoberto que era também um jogador.
Eis o motivo de eu odiar pessoas. Nenhuma valia a pena ser gostada. A única que chegou no meu coração estava morta. E Ernest Abertton pagaria até seu último suspiro por isto.